Indicada ao Prêmio Anna Nery pelo Coren/SC, Helen Bunn Schmitt conta sua trajetória

 As mudanças do atendimento à população depois da implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) transformou a rotina dos profissionais. Helen Bunn Schmitt estava terminando a graduação em Enfermagem quando tudo isso ocorreu e foi assim que iniciou sua carreira, praticamente junto com a criação de estratégias e programas na Atenção Primária. Por todos os resultados alcançados e pela contribuição que ela ofereceu para a valorização da Enfermagem no Estado, Helen foi indicada pelo Coren/SC para receber o Prêmio Anna Nery, promovido pelo Cofen junto com os conselhos regionais e que homenageia profissionais compromissados com o cuidado. A entrega do Prêmio será durante o 21º Congresso Brasileiro dos Conselhos de Enfermagem (CBCEnf), que ocorrerá entre 26 e 30 de novembro.

Confira a entrevista:

 

– Pela sua trajetória, você sempre defendeu o fortalecimento do SUS. Quais os desafios atuais e como podemos superá-los?

– Quando me formei,o Sistema Único de Saúde estava nascendo. Vivi este nascimento sem entender muito em que consistia a mudança, sair da Fundação Hospitalar de Santa Catarina e passar a ser Secretaria de Estado da Saúde (SES) parecia só a mudança de quem pagava meu salário. Com o passar do tempo, a partir das capacitações realizadas pela SES, as especializações que fui fazendo, a minha trajetória na academia, fui entendendo a profundidade das mudanças e me identificando com as bases do SUS. A Universalidade do acesso, a igualdade e equidade me encantam, é preciso diminuir a distância entre os que mais tem e o que menos possuem, é preciso entender que saúde é o resultado das condições de vida de uma população. Em relação aos desafios, estamos, ao meu ver, vivendo tempos difíceis. Uma parcela de nossa sociedade entende saúde enquanto somente o contrário de doença, bem como, não aceita que a diferença social leva ao adoecimento. A culpabilização individual, bem como, a falta de alteridade está presente em muitos atos, inclusive da própria enfermagem. Vejo a superação destes enormesproblemas a partir da educação. Da mesma forma que eu me formei a partir da educação, precisamos promover a educação em todos os espaços, fortalecendo a solidariedade, problematizando a realidade e buscando transformá-la.

 

– Entre suas atividades, destacamos a implantação da Estratégia Saúde da Família. Como foi este trabalho?

– A Estratégia de Saúde da Família realmente foi uma constante em minha vida. Eu fazia parte da equipe que estava na Secretaria de Estado da Saúde em 1994, quando as primeiras equipes do então Programa de Saúde da Família (PSF), foram montadas no Estado. Lembro das reuniões internas e com os gestores e técnicos municipais, capacitações, planejamento, construção coletiva. Depois fui vivenciar o ainda PSF no município, primeiro como enfermeira de equipe e depois como coordenadora de saúde. Com a transformação para ESF, eu estava novamente na SES e pude continuar no auxílio da construção. Foi muito prazeroso acompanhar esta implantação, planejar a expansão, participar de espaços de reflexão e reorganização, ajudar a lapidar…Penso que a ESF é a forma mais adequada de se realizar a atenção básica em nosso país.

 

– Como foram as experiências na atuação em secretarias municipais de saúde como gestora?

– São espaços prazerosos mas também muito duros, difíceis. Minha formação em planejamento em saúde me embasava tecnicamente para realizar as ações de saúde necessárias, porém vivenciava na pele o mais diversos objetivos das instituições e pessoas, que não necessariamente eram os da necessidade de saúde da população, sempre entendendo sáude de forma ampliada. O mais importante desta trajetória consiste em que por todos os lugares por onde passei encontrei e convivi com pessoas maravilhosas, servidores públicos de carreira ou comissionados éticos, companheiros, trabalhadores, defensores de uma saúde pública de qualidade. Tenho muitos conhecidos pelo estado, e porque não dizer pelo Brasil de demonstram em ato que é possível fazer um trabalho de qualidade.

 

– Sobre o Programa Saúde do Trabalhador e a Saúde no Sistema Prisional, como foi implantar essas ações?

– São também, a exemplo da gestão, espaços prazerosos e difíceis. Os dois espaços possuem uma característica muito peculiar, eles precisam ser construídos a muitas mãos e não há consenso na sociedade sobre seu real valor. Não há como trabalhar estes aspectos sem a co-responsabilização de órgãos outros, fora do âmbito da saúde. É preciso negociar, construir os planos de ação no coletivo, trazer parceiros do legislativo e do judiciário, é preciso interpretar as portarias, sentar em volta de uma grande mesa e colocar no papel as necessidades de forma dialógica. Outro aspecto importante consiste em que também é preciso escutar o sujeito para quem estamos elaborando as políticas, ou seja, os trabalhadores e as pessoas privadas de liberdade.

Novamente as pessoas dos diversos órgãos fizeram a diferença, pois conseguimos construir grandes plano de ação, com a co-responsabilização dos órgãos.

No caso da Política de Atenção Integral a Saúde da Pessoa Privada de Liberdade no Sistema Prisional- PNAISP, em 2016, o estado de Santa Catarina foi um exemplo para todo o país, na forma colegiado como conseguiu organizar a política. Este fato me enche de orgulho.

 

 

– Como você avalia o trabalho da Rede Cegonha, seus benefícios, já que você foi uma das que ajudou na implantação?

– A minha ligação com a Rede Cegonha se deu a partir do trabalho na Atenção Básica. Como coloquei em relação as duas políticas anteriores, as portarias ministeriais são publicadas e cabe aos técnicos planejar como colocá-las em ação a partir da realidade de cada território. Quanto mais participativo for o processo, mais chances de ser realizado. A lógica da participação, co-responsabilização, protagonismo eu aprendi ao longo do tempo com as Políticas de Humanização da Atenção e da Gestão no SUS, de Educação Permanente e de Educação Permanente em Movimento. O apoio matricial também me ofereceu ferramentas úteis para o auxílio na construção desta política.

 

– Por fim, como você avalia a experiência da 1ª Conferência de Enfermagem realizada pelo Coren/SC, onde você coordenou a Comissão de Relatoria?

– Eu sou uma pessoa apaixonada pelos espaços de conferencias. Penso que são espaços de construção, reflexão, troca, busca de conhecimento, construção de caminhos.

Quando fui convidada pelo Coren/SC para auxiliar no planejamento da 1ª Conferencia de Enfermagem, desde o primeiro momento tinha certeza que seria um grande momento de reflexão e elaboração de caminhos para a enfermagem catarinense e nacional. A comissão de relatoria, na minha experiência, é uma comissão que precisa estar sempre atenta e trabalhando, desde a montagem da conferência, no momento final e depois nos relatórios. Apesar de meu nome estar como coordenadora da relatoria, novamente preciso reforçar que o que acorreu foi um grupo trabalhando em conjunto, trocando experiências, fazendo reuniões, se responsabilizando igualmente. A comissão montada para a conferencia, capitaneada pela Presidente Helga, fez com que ninguém se sentisse sozinho, foi tudo construído no coletivo, até por esta razão foi o sucesso que vivenciamos.

Gostaria por fim de agradecer muito a profissão de enfermagem que me deu a oportunidade de crescer enquanto pessoa e ser humano, que me abriu os caminhos para a academia, para a docência que também amo. Quero agradecer ainda a enfermagem de Santa Catarina, representado pelo Coren/SC que me deu a honra de receber este premio, e principalmente a todos e todas que encontrei nesta caminhada de 33 anos que com certeza me constituíram naquilo que hoje eu sou. Me espelho em Paulo Freire, nosso educador tão em voga nestes tempos vividos, e termino dizendo que:

“Ninguem caminha sem aprender a caminhar, sem aprender a fazer o caminho caminhando, refazendo e retocando o sonho pelo qual se pôs a caminhar”